Discursos de autoridades dão impulso a desmatamento da Amazônia, indica estudo

Por Lisandra Paraguassu

BRAS?LIA (Reuters) - A ret?rica de governantes a favor da flexibiliza??o das leis ambientais e puni??es menos duras t?m rela??o pr?xima com o avan?o do desmatamento na Amaz?nia, de acordo com estudo divulgado nesta ter?a-feira pelo Instituto Socioambiental (ISA) com base em dados do sistema de alertas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

O ISA, uma organiza??o n?o governamental, comparou as datas de visitas ou falas de autoridades --incluindo o presidente Jair Bolsonaro, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e o governador do Acre, Gladson Cameli (PP)-- sobre casos espec?ficos com os n?meros de alertas de aumento de desmatamento coletados m?s a m?s pelo sistema Deter, do Inpe.

Um dos casos relacionados pelo ISA mostra uma fala de Bolsonaro, que desautorizou uma opera??o do Ibama em Cujubim (RO). Na ?poca, fiscais queimaram tratores encontrados com madeireiros ilegais, como permite a lei.

Em seguida, Bolsonaro afirmou que Salles havia conversado com ele e que iria abrir processo administrativo contra os fiscais. 'N?o ? pra queimar nada, maquin?rio, trator, seja o que for, n?o ? esse procedimento, n?o ? essa a nossa orienta??o', disse o presidente em um v?deo gravado durante uma viagem a Macap? (AP).

De acordo com os dados do Deter, em maio os alertas de desmatamento em Cujubim aumentam 455% em rela??o a abril, 98% maior que o mesmo per?odo do ano anterior, segundo o estudo.

Em julho, o ministro do Meio Ambiente se reuniu com madeireiros em Espig?o D'Oeste (RO), alguns dias depois de um caminh?o do Ibama ser queimado pelo grupo ap?s uma opera??o em que 70 madeireiras foram impedidas de operar. Salles disse aos madeireiros reconhecer a import?ncia da atividade e que iria analisar os pedidos feitos por eles.

No mesmo m?s, os alertas de desmatamento no munic?pio cresceram 332% em rela??o a maio. Em agosto houve aumento de 247% e, em setembro, de 283%, tamb?m na compara??o com maio, de acordo com o levantamento do ISA.

No final de maio, o governador do Acre recomendou aos produtores rurais, durante, visita ao munic?pio de Sena Madureira, que se o Instituto do Meio Ambiente do Acre (Imac) --?rg?o respons?vel pela fiscaliza??o no Estado-- estivesse multando, o avisasse. 'Me avisem e n?o paguem nenhuma multa', disse Cameli em um discurso a produtores do munic?pio.

A fala s? se tornou p?blica no final de julho, mas nos meses subsequentes ao discurso, julho e julho, os alertas e desmatamento indicaram um aumento de mais de 5.000% em Sena Madureira. Nos munic?pios vizinhos de Manoel Urbano e Feij?, os alertas no mesmo per?odo aumentaram 826% e 1.514%, respectivamente.

N?o apenas falas, mas tamb?m atos de autoridades podem ter contribu?do para o aumento do desmatamento. Em maio, o governo determinou que o Ibama passasse a anunciar antecipadamente os locais onde seriam feitas fiscaliza??es.

Logo em seguida, no munic?pio paraense de Novo Progresso --onde em agosto aconteceu o chamado 'dia do fogo'--, os alertas de desmatamento registrados em 2019 aumentaram 484% em compara??o com abril. Em junho, o aumento dos alertas foi de 244%. Na mesma regi?o, na floresta nacional de Jamamxim, uma das mais visadas pelos desmatadores, os alertas cresceram em maio 1.145%.

Respons?vel pelo estudo, o pesquisador do ISA Antonio Oviedo disse que a rela??o ? direta e assustadora.

'? incr?vel a gente ver como essa narrativa pol?tica tem um poder muito grande de mobiliza??o das pessoas. E para a gente voltar atr?s n?o vai ser do dia para noite. Quando tempo vai levar para restaurar essa ordem? Muito vai ser desmatado, muitas pessoas ser?o assassinadas', disse ? Reuters.

O estudo relaciona os discursos e a??es das autoridades ? dificuldade dos fiscais em atuar nessas regi?es.

'A pol?tica ambiental n?o se faz com desconstru??o e discursos incendi?rios ou que exaltam os setores que mais devastam a Amaz?nia. Na maioria das vezes, em se tratando de explora??o de madeira, os setores favorecidos por esse discurso pol?tico atuam na ilegalidade', diz o relat?rio do ISA.

'Quando tivemos a presen?a do Estado, como por exemplo a recente GLO para combater o fogo na Amaz?nia, os ?ndices de desmatamento e fogo ca?ram. E garimpos ilegais foram paralisados. Ou seja, a fiscaliza??o inibe o desmatamento.'

A Reuters procurou a Presid?ncia da Rep?blica, o Minist?rio do Meio Ambiente e o governo do Acre. Por e-mail, o Pal?cio do Planalto disse que n?o comentaria. O minist?rio e governo do Acre n?o responderam de imeadiato.