CORREÇÃO-ENFOQUE-Bolsonaro apoia privatizações e embala sonhos e pesadelos sobre futuro da Petrobras

(Corrige nome do advogado do escrit?rio TozziniFreire para Leonardo Miranda)

Por Luciano Costa

S?O PAULO (Reuters) - O recente apoio do presidente Jair Bolsonaro ? privatiza??o de gigantes estatais como Correios e Eletrobras come?ou a alimentar entre alguns investidores e especialistas a esperan?a de que sua gest?o possa em algum momento colocar na mesa planos de desestatiza??o da maior e mais emblem?tica empresa do pa?s.

Fundada em 1953 pelo presidente Get?lio Vargas ap?s uma campanha sob o slogan 'O Petr?leo ? Nosso!', a Petrobras foi vista por d?cadas como orgulho nacional, at? que um enorme esc?ndalo de corrup??o descoberto nos ?ltimos anos amea?ou sua imagem e sa?de financeira e disparou um processo de reestrutura??o que tem passado por diversas vendas de ativos.

As descobertas da opera??o Lava Jato, que ficou famosa ao redor do mundo, tamb?m ajudaram o Brasil a eleger Bolsonaro no ano passado, em campanha marcada por discurso antiestabilishment e pelo destaque dado ao atual ministro da Economia, Paulo Guedes, um liberal formado na Universidade de Chicago que j? defendeu em p?blico a venda de todas estatais.

'A gente vai somando um coment?rio aqui, outro ali, de pessoas, logicamente, que s?o protagonistas nesse processo de decis?o, e essa ideia da privatiza??o (da Petrobras) eventualmente come?a a ganhar algum tipo de for?a', disse ? Reuters o analista do banco su??o UBS, Luiz Carvalho.

Carvalho assinou relat?rios recentes nos quais convidou investidores a especularem sobre a possibilidade de a petroleira entrar nos planos de desestatiza??o do atual governo. 'Pense grande, sonhe grande', escreveu ele, ainda em maio.

Citando 'pistas' como uma fala de Bolsonaro a jornalistas de que seria contr?rio apenas ? venda do Banco do Brasil e da Caixa, Carvalho defende que a desestatiza??o poderia ocorrer com a venda de pap?is do Banco Nacional de Desenvolvimento Econ?mico e Social (BNDES) na petroleira e o governo diluindo sua fatia com uma unifica??o de classes de a??es, o que levaria a Uni?o a ficar com menos de 50% da empresa e garantiria sua ida para o Novo Mercado, que exige o mais alto n?vel de governan?a.

Esse modelo, pelo qual a Petrobras 'deixaria de ser uma estatal para se tornar uma empresa privada controlada pelo governo', ainda poderia evitar a necessidade de aprova??o legislativa para o neg?cio, segundo relat?rio do UBS em julho.

O formato lembraria o adotado pela petroleira para se desfazer do controle da BR Distribuidora, desestatizada em julho com uma oferta de a??es em bolsa, definida como 'hist?rica' pelo presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.

O atual CEO, inclusive, j? se manifestou a favor de uma Petrobras privada antes de assumir a companhia, neste ano. ? frente da estatal, no entanto, ele afirmou que n?o possui mandato para privatizar a empresa, mas ir? acelerar vendas de ativos para concentrar o foco em reservas do pr?-sal.

SEM ATALHOS?

A Lei do Petr?leo, de 1997, determina que a Petrobras deve ter a??es ordin?rias e preferenciais, com a Uni?o detendo 'no m?nimo, 50 por cento das a??es, mais uma a??o, do capital votante', o que dificultaria o caminho sugerido pelo UBS, disse o s?cio da ?rea de ?leo e G?s do Veirano Advogados, Ali Hage.

'Sem altera??o legislativa, n?o vejo como', afirmou ele, destacando que, por outro lado, a estatal teve recente aval do Supremo Tribunal Federal (STF) para vender subsidi?rias mesmo sem autoriza??o do Congresso.

Para Hage, seguir com os desinvestimentos poderia ser mais interessante para a empresa e para o governo, at? devido ao 'desgaste' que uma proposta de privatiza??o poderia gerar.

O s?cio da ?rea de petr?leo e g?s do escrit?rio TozziniFreire, Leonardo Miranda, disse que ? dif?cil pensar na venda da Petrobras por meio de uma 'gin?stica societ?ria', sem aprova??o no Congresso, mesmo que houvesse tal possibilidade.

'N?o ? uma empresa qualquer, voc? est? falando da Petrobras.'

Al?m disso, um movimento de mudan?a no controle da companhia exigiria outras altera??es legais, como o fim do direito de prefer?ncia concedido a ela em leil?es de petr?leo, por exemplo.

'Se a pergunta ?: o governo vai fazer o poss?vel e o imposs?vel para privatizar a Petrobras nesse mandato? Eu acho que sim... mas n?o acredito que tenha alguma viabilidade de aprova??o que n?o seja por meio do Congresso, de fato', afirmou.

Nesse sentido, os planos de privatiza??o da Eletrobras, aprovados por Bolsonaro na semana passada, que preveem envio de projeto de lei ao Congresso, podem ser o 'o grande teste' de viabilidade de uma eventual proposta similar para a Petrobras.

Assim como a petroleira, a Eletrobras teve a cria??o proposta por Vargas nos anos 1950 --embora tenha sa?do de fato do papel mais tarde, em 1962-- e ? vista por muitos como estrat?gica devido a seu predom?nio na gera??o e transmiss?o de energia no Brasil.

'A gente enxerga que (a Petrobras) ? sim um sonho grande do time do Minist?rio da Economia, talvez o maior de todos. Mas teria um longo caminho... Tem a Eletrobras a? na fila e outras, que v?o dar mais ou menos um 'cheiro' para o mercado sobre o que esperar de Petrobras nesses quatro ou talvez oito anos de Guedes e Bolsonaro', disse o diretor da gestora de recursos BlackBird, Bruno Di Giacomo.

Guedes j? falou em uma meta de arrecadar at? 1 trilh?o de reais com privatiza??es para reduzir o d?ficit fiscal do pa?s. A Petrobras tem um valor de mercado de 357 bilh?es de reais, segundo dados da Refinitiv.

SONHO OU PESADELO?

Vista como um 'sonho' por analistas e muitos investidores, a venda do controle da Petrobras ? encarada como pesadelo por outros, que consideram a companhia estrat?gica.

O pr?prio Bolsonaro defendeu essa vis?o no passado --em 2005, ele afirmou aos risos em entrevista ao apresentador J? Soares que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ser 'fuzilado' por 'entregar nossas reservas petrol?feras para o capital externo' e 'o que ele fez com as privatiza??es.'

Neste ano, no entanto, Bolsonaro tem dado sinais de uma nova posi??o --ele afirmou por meio de seu porta-voz em abril que 'em tese' teria 'simpatia inicial' pela desestatiza??o da petroleira. Na ter?a-feira, Bolsonaro ainda disse que teve um 'passado estatizante' e destacou estar 'aprendendo muito'.

O vice-diretor do Instituto de Energia e Meio Ambiente da Universidade de S?o Paulo (IEE-USP), Ildo Sauer, que foi diretor de G?s e Energia da Petrobras no governo Lula, avaliou que a estatal ser? reduzida a uma fra??o do que j? foi no atual governo, em meio ? continuidade dos desinvestimentos, mas disse que n?o se surpreenderia com uma privatiza??o.

'Obviamente o esfor?o do governo vai nesse sentido, por raz?es ideol?gicas... mas eu acho que vai haver resist?ncia', afirmou ele ? Reuters.

'Se n?o puder vender o CNPJ, fica ele e o pr?dio, ou talvez s? o andar onde fica a diretoria... o resto ela pode vender. ? um desastre da maior propor??o.'

Sauer, para quem o Brasil deveria controlar a produ??o de ?leo para influenciar pre?os, como fazem pa?ses da Organiza??o dos Pa?ses Exportadores de Petr?leo (Opep), ainda disse que a Lava Jato ajudou a vender o argumento de que privatizar a petroleira teria efeitos positivos, vis?o da qual discorda.

'H? uma imagem constru?da contra a Petrobras a partir dos lament?veis e criminosos epis?dios que existiram. Mas ? como se arrombassem uma porta da sua casa. E a? voc? vende a casa para morar de aluguel', comparou.

A luta contra uma eventual privatiza??o da Petrobras tamb?m ? encampada por sindicatos de trabalhadores, que lan?aram a campanha 'O Petr?leo tem que ser nosso!', que ecoa o antigo slogan que levou ? cria??o da empresa, defendendo que ela continue '100% estatal e p?blica'.

(Por Luciano Costa)