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ESPECIAL-O que separa crianças indígenas de suas famílias: pobreza ou preconceito?

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Por Karla Mendes

DOURADOS, Mato Grosso do Sul (Thomson Reuters Foundation) - Como juiz, Zaloar Murat Martins de Souza tem que tomar decis?es dif?ceis. Cada vez mais, ele se depara com uma das mais delicadas -- separar ou n?o uma crian?a de sua fam?lia.

Souza atua h? 14 anos como juiz da Vara da Inf?ncia e da Juventude em Dourados, Mato Grosso do Sul, onde um n?mero significativo de crian?as ind?genas tem sido levado para abrigos, levantando discuss?es sobre quem tem melhores condi??es de cuidar de jovens vulner?veis.

A pobreza est? impulsionando a depend?ncia de drogas e ?lcool, disse o juiz, e aumentando a viol?ncia entre comunidades ind?genas de Dourados, cidade com uma popula??o de cerca de 220 mil pessoas, incluindo cerca de 10 mil ind?genas.

?A grande maioria vive em estado de mis?ria. E esse estado ? que traz a destitui??o da fam?lia?, disse Souza ? Thomson Reuters Foundation em seu escrit?rio, olhando para uma pilha de processos.

?(A gente) se depara com uma situa??o que fere o brio do homem branco... Alcoolismo e drogadi??o s?o os dois grandes males das nossas aldeias?.

O n?mero de crian?as e adolescentes ind?genas em abrigos dobrou de 19 em julho de 2014 para 38 em julho deste ano, segundo dados levantados pela assistente social judici?ria Ana Li?ge Char?o Dias Borges a pedido da Thomson Reuters Foundation.

Mas a Funda??o Nacional do ?ndio (Funai) alerta que crian?as t?m sido retiradas de seus pais de maneira equivocada.

Em relat?rio publicado em novembro, a Funai informou que recebeu den?ncias de crian?as sendo retiradas de suas fam?lias ?sem aviso, sem apresentar motiva??o, sem tempo para despedidas, sem falar com a crian?a na l?ngua materna?.

Ao serem colocadas em abrigos, as crian?as s?o for?adas a se adaptar a um modo de vida novo e desconhecido, o que torna dif?cil sua reintegra??o ? comunidade ind?gena, segundo o relat?rio.

?(A crian?a) esquece os costumes, esquece a l?ngua materna... tirar as crian?as de um povo tamb?m ? condenar esse povo a n?o ter futuro coletivo?.

Borges afirma que crian?as ind?genas respondem por mais da metade das crian?as em abrigos em Dourados, um aumento significativo em rela??o h? quatro anos, quando elas representavam menos de um ter?o do total de crian?as abrigadas. No geral, a popula??o ind?gena representa cerca de 5 por cento da popula??o total de Dourados.

Entre essas crian?as est? Ana, uma ind?gena da etnia Kaiow? que foi levada para um abrigo ap?s ter sido estuprada em casa h? dois anos, quando tinha apenas 9 anos de idade. Seu nome foi alterado para proteger sua identidade.

No quarto que ela compartilha com outras tr?s meninas no abrigo, Ana disse ? Thomson Reuters Foundation que sua m?e ficava b?bada frequentemente e sa?a de casa, deixando a menina e sua irm? mais nova sozinhas.

?Ele me machucou... Ele fechou minha boca (e fiquei) sem respirar. Eu mordi a m?o dele, mas s? que ele n?o sentia porque ele estava b?bado?, disse Ana sobre o abuso no escuro, cercada por bonecas e sentada em sua cama.

Documentos judiciais citam seu pai como o principal suspeito.

?QUERO MEU FILHO?

Ana agora vive no Lar Santa Rita, onde crian?as retiradas de seus pais permanecem at? que um juiz decida se elas podem retornar para suas fam?lias ou se elas ser?o levadas para ado??o.

O local tem uma escola e casas onde as crian?as vivem sob supervis?o de um respons?vel em tempo integral, cercadas por brinquedos. Para muitas, a vida no abrigo ? melhor que na aldeia.

De acordo com o Estatuto da Crian?a e do Adolescente, crian?as s? podem permanecer em abrigos por um per?odo m?ximo de 18 meses. Mas a Funai informou que algumas permanecem por v?rios anos -- e, quanto mais ficam, mais dif?cil ? para voltarem para suas casas.

A diretora do Lar Santa Rita, M?nica Roberta Marin de Medeiros, disse que n?veis crescentes de viol?ncia e abusos s?o o principal obst?culo para enviar as crian?as de volta para suas fam?lias.

A Lei Nacional de Ado??o estabelece que crian?as ind?genas s? podem ser adotadas por pais n?o ind?genas depois que todas as op??es forem esgotadas dentro da pr?pria comunidade, disse Medeiros.

?lida Oliveira, uma ind?gena da etnia Kaiow?, disse que seu filho foi retirado dela apenas uma semana ap?s dar ? luz em 2015.

Quando (ele) completou oito dias (agentes de sa?de) chamaram o conselho (tutelar): ?tem que levar crian?a porque Dona ?lida n?o tem condi??o de criar?.

Oliveira, que possui outros cinco filhos, incluindo um beb? de menos de 2 anos que ainda vive com ela, negou, dizendo que sempre foi capaz de alimentar sua fam?lia.

?Eu senti falta. ? o meu filho. Quero de volta... Eu estou viva, eu n?o estou morta?, disse Oliveira, de 39 anos, do lado de fora de sua casa de madeira, em um assentamento ind?gena em Dourados.

O juiz Souza, que atuou no caso desde o in?cio, disse que decidir? em breve se a crian?a ser? devolvida para a m?e ou se ser? colocada para ado??o.

?Tem que ver como est? essa situa??o de v?nculo. N?o nasce de uma hora para a outra... J? se passaram tr?s anos?, disse.

?QUANDO TUDO DER ERRADO?

Di?genes Cariaga, um antrop?logo de Dourados, disse que crian?as ind?genas s? devem ser levadas para abrigos ?quando tudo der errado?.

N?o podemos afirmar que todos os moradores da aldeia s?o agentes de viol?ncia... o que tem que se evitar ? que essa crian?a volte a conviver com o seu ciclo de abusadores?, disse.

Em vez disso, disse Cariaga, autoridades devem atuar nas ra?zes dos abusos e neglig?ncias de crian?as - como pobreza, depend?ncia qu?mica e condi??es insalubres.

Quando Ana entrou no abrigo em 2016, a primeira coisa que lembra ? que ?as meninas todas estavam limpas quando cheguei e eu estava suja?.

Ainda assim, ela sonha em voltar para casa, pois disse que sua m?e a visita regularmente e n?o fica mais b?bada.

'Eu acho muito melhor ela parar de beber... (Vamos poder) ir para a igreja direto, ir para a escola, brincar... at? eu crescer?.

Outras crian?as preferem uma nova vida, entre elas Carolina, de 10 anos, que tamb?m teve seu nome alterado. Ela mora no abrigo de crian?as desde 2016, quando l?deres comunit?rios e agentes de sa?de relataram que ela era negligenciada por sua m?e, que tamb?m ? dependente de bebida alc?olica e a deixava sozinha em casa com sua irm?.

?Aqui ? melhor porque aqui tem uma cama para dormir, uma comida pra comer e tamb?m a gente dorme quentinho. A gente n?o passa frio (como na aldeia)?.

Escrito por Redação

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